sábado, 14 de abril de 2018

Dois corpos, um só.

DISCLAIMER: O texto abaixo não é recomendado para pessoas menores de idade, tímidas, cheias de pudores e tabus em relação a sexo, ou todos aqueles que irão me olhar com vergonha e/ou reprovação.

Gail sairia mais cedo da redação naquela sexta e iria direto pra casa esperar por mim, tinha prometido a ela preparar um jantar especial pra nós dois. Abri a porta, soltei as chaves na mesa e dei meu tradicional cumprimento à Cleo - um "cheirinho" e um ligeiro abraço - que se esticava, indiferente e graciosa à minha chegada, ao mesmo tempo, na poltrona bege da sala. Caminhei até o quarto e encontrei roupas femininas jogadas em cima da minha cama e um sutiã enroscado sutilmente na porta do banheiro entreaberta. A pista era clara, mas ela ainda não tinha notado minha presença. Entrei vagarosamente e fiquei observando-a através do box de vidro transparente, ofuscando parcialmente minha visão pelo embaçamento causado pelo vapor.
Seu corpo era maravilhoso, parecia esculpido em cera, talvez em um gesso fino. Artes esculturais estavam fora das minhas habilidades pra definir o que aquilo pareceria. As moças que faziam tutoriais de "corpos para o verão" para a internet chorariam copiosamente se por acaso descobrissem meus pensamentos em relação ao corpo delas comparados ao de Gail.
Os pés, as panturrilhas, as coxas, o bumbum, o desenho das suas costas, seus seios fartos, seu pescoço sedutor e sua barriga "fora dos padrões 'chapados' das revistas" eram um completo deleite aos meus pensamentos mais luxuriosos e indecentes. Suas curvas eram acentuadas e agudas na medida correta, a sua pele macia era um convite ao meu corpo e à minha boca - principalmente. Eu adorava passar meu tempo beijando seu corpo e brincando com o contato que minha língua tinha com sua pele e a reação que a minha própria namorada tinha: os arrepios, as risadas tímidas, e até os bicos enquanto eu elogiava até suas estrias e celulites. Em minha defesa e de todos os homens sensatos, elas são a parte mais perfeita das imperfeições de uma mulher - "imperfeições", que fique claro, pelo ponto de vista delas. Eu achava maravilhoso, afinal era aquilo que diferenciava ela dum manequim, por exemplo. Eram as marcas que comprovavam que ela era uma mulher de verdade, perfeita para um tolo apaixonado que abraçava a retórica do que era estar apaixonado por alguém.
Lancei uma leve pigarreada sarcástica para anunciar minha presença e me armei de maneira sutil com as covinhas que me foram presenteadas pelos genes positivos de meus pais e que ela tanto gostava. Ela se inclinou contra o box e, de uma maneira angelicalmente demoníaca apenas assentiu com o dedo indicador, me chamando para se juntar à ela. Nem de longe eu era uma pessoa tímida, muito menos seria na frente da pessoa com que há anos dividia a vida comigo, mas ao vê-la assistindo meu ato de remover as roupas me deixou, de certa forma, sem graça. Acabei por perceber que quanto mais eu enrolava, mas ela se divertia. Ela se fixou em cada botão aberto, no nó afrouxado da gravata e na braguilha da minha calça abrindo.
Abri a porta do box de maneira escancarada e observei seu corpo todo ensaboado, com o branco da espuma flertando com a palidez do seu corpo. Ela virara de costas, de propósito, num misto de provocação e inocência, indicando pra que eu a esfregasse as costas. Massageei-a com a esponja de maneira delicada, aproveitando aquele momento tanto quanto ela. Passei uma das mãos pela sua cintura e a puxei para baixo da água, para mais perto de mim. Senti um suspiro e, para acompanhar sua reação, beijei-a no pescoço. Senti sua mão direita procurando a minha que se depositava na sua barriga. Num ato quase que de reflexo, abracei-a, enquanto respondendo à minha ação, ela agarrou minha mão e a trouxe mais perto da virilha, dando uma indicação mais do que clara do que ela queria. Abracei-a mais forte e desci minha mão ao encontro do que ela queria, sentindo instantaneamente um gemido enquanto comecei a tocá-la. A água quente do chuveiro parecia fria em relação aos nossos corpos naquele momento. Sua mão esquerda, ainda livre, deslizou com certa habilidade, para quem estava de costas, pelo meu abdômen até encontrar tarefa parecida com a que eu estava executando. A minha, no entanto, percorreu o sentido contrário agarrando com firmeza e carinho seu seio. Naquele momento, o tesão já se apossava dos nossos corpos. O desejo que eu tinha por aquela mulher era algo que dificilmente os pesquisadores da área conseguiriam encontrar em outro casal e, aparentemente, abusando da arrogância, era recíproco.
Ela se virou com um movimento rápido e laçou seus braços pelo meu pescoço, enquanto a agarrei pela cintura e apertei contra mim. Ela me beijou como poucas vezes havia feito, como se sua vontade fosse sugar minha essência para dentro de si, apaixonadamente. Retribuí, apertando mais ainda seu corpo contra o meu. Abri a porta do box e a conduzi pelo braço. Ainda molhados e entorpecidos pelo calor do momento, joguei-a na cama assim que saímos do banheiro. Seu corpo esticado na cama, convidativo e oferecido ao meu prazer, faziam meus instintos borbulharem como a lava de um vulcão prestes a entrar em erupção. Meu auto-controle, por sorte, ainda estava sob minha lucidez. Comecei beijando seus pés e subi, devagar, pelas suas pernas, sua virilha, sua barriga, por entre os seios até encontrar seu pescoço. Cada toque dos meus lábios contra sua pele soava como um choque, que era não só ouvido mas também sentido, tanto pelo corpo dela quanto o meu. Mas nesse momento, seu corpo nada mais era do que uma presa fácil para a minha posição predatória, por cima, enquanto nossos olhos formavam uma linha fulminante que colocaria fogo em qualquer superfície inflamável que estivesse por perto caso se perdessem no encontro. Passei a beijá-la e desci, de novo, pelo seu corpo, agora encontrando cada detalhe, tantos dos seus seios quanto onde eu sabia que iria fazê-la perder a cabeça. Enquanto eu a chupava, conseguia observar seus dedos lutando contra os lençóis e sua boca se contorcer ao mesmo ritmo que seus olhos se fechavam e sua respiração ficava cada vez mais irregular, entregando sem pudor que se deliciava com os movimentos que minha língua fazia. Eu ainda não consigo conceber se era a paixão ou o tesão que faziam com que eu gostasse até do sabor dela. Eu sentira suas pernas tremerem e seus gemidos cada vez mais altos a denunciavam, ela havia montado os cavalos brancos.
Seus olhos tomaram vida de novo, como se sua alma tivesse abandonado e voltado ao corpo naqueles últimos segundos, até que ela resolveu avançar em minha direção como um felino, me jogando de costas contra a cama e trocando nossas posições. Suas mãos sobre meu peito e sua boca delineadamente sensual formavam uma imagem perfeita, sedutora e atiçadora, mas que eu poderia encarar e resistir, ainda. Depois de colar seu rosto contra o meu, seus lábios procuraram minha orelha e desceram pelo meu pescoço, passeando pelo meu peito, minha barriga, até encontrar o que ela buscava. Sua boca me abocanhara como se fosse algo suculento, fazendo com que meu cérebro produzisse certos espasmos que eu não sabia decifrar, fazendo com que suas unhas em minhas pernas e os barulhos de saliva e sucção fossem as poucas coisas que mantinham minha lucidez, ainda que por um fio, longe da loucura. Depois de alguns minutos tão longos quanto horas, seu corpo escalou o meu, seus braços agarraram minha nuca e meu braço. Dali pra frente, nossos corpos se tornaram um só e o eu-lírico perdeu por completo sua lucidez pra conseguir descrever o que ali se sucederia a seguir. O que posso garantir é que havia suor, suspiros, gemidos, arranhões... Nossa sintonia na cama era absurda, irreal.

Ela dormiu no calor dos meus braços, ainda marcados pelo amor que acabáramos de fazer. Sua cabeça contra meu peito, nossos corpos ainda nus, enlaçados. Eu fazia carinho em seus cabelos e a assistia dormir, como um anjo que recentemente havia abandonado os pecados da carne mortal e voltara ao seu estado celestial. Eu poderia observá-la dormindo por horas, dias, séculos, se me fosse possível. Nem os maiores poetas descreveriam o amor que eu sentia por aquela moça com palavras, termos e expressões mais apropriados do que os que eu tinha em mente. Eles não se formavam em simples conjugações e junções de letras, não. Eu sentia, aquilo era o maior amor do mundo, sem dúvida alguma.

Cya.

Socos. Minha costela.

Gail era apaixonada por cachorros. Quando passávamos o final de semana em casa, costumávamos acordar cedo no domingo pra ir até o Central Park em minha moto para aproveitar a manhã, geralmente não fazendo nada. Eu não fazia nada, para falar a verdade. Minha única missão era ser um observador poetizando sobre a beleza dela enquanto ela caminhava na grama, enquanto o sol refletia o brilho da sua pele palidamente linda, enquanto ela sorria assistindo as crianças brincarem com seus cachorros pelo parque, enquanto ela simplesmente era ela, sentada, observando o céu, "sendo linda", como eu costumava dizer. Enquanto ela olhava pra mim e sorria, como se aquilo fosse uma obra de um deus que eu refutava a existência, mas que poderia ser o único capaz de produzir um sorriso hipnotizante e maravilhoso, algo que parecia ter sido feito especialmente para mim, algo que eu admirava com estranheza de tanta perfeição que se revelava, de tanta harmonia e paz que meu coração se enchia ao observar cada curva dos seus lábios se abrindo e revelando seus dentes cor-de-marfim.

Hoje acordei cedo, troquei de roupa, tomei meu religioso café, desci até o estacionamento e liguei a moto. Eu partiria para o parque pela primeira vez sem ela. Eu não tinha mais que firmar os pés para ela subir na garupa. Eu não sentia mais seus dedos enfiados nos bolsos da minha jaqueta buscando abrigo do frio. Eu não sentia mais seus braços enlaçando a minha barriga, nem sua respiração quente beijando minha nuca. Eu não sentia mais nada, só um vazio.
Eu cheguei até o Central Park e observei as crianças, os casais, os cachorros, os freesbies voando, as bicicletas, as cestas de piquenique, eu via vida em tudo que vinha de fora. Eu não via nada que se conectasse comigo. Eu não via nada ao meu lado. Eu não via nada dentro de mim, só sentia. Sentia como se o som dos pássaros, das crianças rindo e das pessoas conversando fossem zumbidos irritantes, como se a felicidade alheia dessas pessoas fosse uma ofensa à minha amargura sórdida e podre, quase que pestilenta ao meu coração e ao sentido da minha existência. Como se tudo tivesse perdido o sentido por fazer tanta falta aquele pedaço de mim. Como se eu estivesse nu, não de roupas, mas de sentido para estar ali.
Eu insistia em frequentar os lugares que eu costumava ir com ela como um ritual pra tentar achar que minha companhia era o suficiente, em pensar que eu podia existir sem ela. Não, não existia mais Duncan sem Gail. Eu abri meu peito, arranquei meu coração violentamente e depositei no peito dela. Eu achava que detinha seu coração e a chave do meu próprio peito. Nenhum coração entra mais nesse peito que arde, nesse peito morto-vivo. Morto por não sentir, vivo por doer. Esse dilema me era estranho enquanto doía, me era familiar enquanto vazio. Mas acima de tudo, inóspito. E o meu coração? Provavelmente estaria jogado em alguma viela suja perto do Brooklyn, longe demais pra ser achado, sujo demais pra ser reconhecido.

São quase seis meses sem ela. Me machuca tanto quanto no primeiro dia, me sangra ao ver que ela conseguia fugir disso e eu não, que pra ela há vida, e pra mim solidão. Que eu estava preso a mim mesmo e à lembrança dela, e ao pedaço que faltava em mim. A solidão que por tanto tempo foi minha opção, hoje em dia era minha sina, minha alucinadora prisão. Ela amava cachorros, mas o calor que eu tinha era de saber que a Cleo estaria em minha cama e ronronaria ao sentir meu corpo inerte se jogando contra o colchão e encontraria aconchego, assim que abandonasse o cobertor e caminhasse em direção a mim. Ela já estava enjoada e enojada de me ver chorar, provavelmente. Já eu, não.

Cya.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Domingo.

"E eu deixei todos os meus cigarros na tua casa
O teu descaso me deixou tão só
Talvez eu ache algo mais forte,
que faça eu me sentir melhor." - Esteban.

Cya.

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Só do que eu sei falar.

Amor próprio é só uma desculpa
uma falácia decorada
Até que se ache um peito
pro teu coração fazer de morada.

É sentimento que vive gritando
mas que de fato nasce mudo
Uma simples troca onde
do pouco que tenhas, darás tudo.

A cada maltrato que recebe
fica este arredio
Porque mal sabes, pobre coração
que continuará a cair nessa garra vil

E enquanto permanecer imune
que sofras tu pela ardilosa opção
Porque tu ainda serás tolo
sábio ou insensível não passam de uma efêmera condição.

Cya.

sábado, 7 de abril de 2018

Fogo.

Logo após ter me formado na Brooklyn College em Psicologia, eu consegui uma vaga, graças às recomendações de alguns professores, no New York Presbyterian Hospital. Eu alternava meus turnos entre as unidades do Hudson Valley e do Queens, atuando na área de pesquisa e assistencialismo, principalmente com os pacientes dos setores de oncologia. Eu acabei escolhendo esse campo de pesquisa por um certa ironia: no auge das minhas crises de pânico, um dos meus maiores medos era a morte. Com a depressão, a morte virou uma das minhas maiores obsessões, como se eu ansiasse pela sua chegada e lutasse para atrasá-la ao mesmo tempo, formando um dilema doentio dentro de mim mesmo. E quem, leigo ou letrado, não associa essa maldita condição como se fosse uma das muitas faces da morte?
Dos meus amigos, sempre ouvi que eu tinha vocação para a psicologia, essa minha empatia e minha habilidade de persuadir as pessoas com sutileza e leveza ajudaram muito quando conciliei com as técnicas apropriadas, e o que me motivava mais era me sentir útil e capaz de ajudar pessoas que passavam por problemas parecidos ou tão piores que os meus - no caso dos pacientes de câncer e seus familiares. Não há nada pior que ser seu próprio inimigo, psicologicamente ou fisicamente falando.
Antes do que estou prestes a afirmar, preciso esclarecer que meu corpo é uma espécie de híbrido entre um bordel do século XIX e uma sala cheia de Juan Valdez: a metade que não era feita de bourbon, era feita de café. A referência não é boa, mas é apropriada, principalmente porque eu tinha um costume incomum de consumir whisky à luz do dia e café durante a noite. Uma das poucas vezes - pra não dizer a única - que tive uma leve consideração em levar em conta existência de deus foi que, tanto na unidade do Hudson quanto na do Queens, eu tinha um Starbucks praticamente ao alcance dos meus braços - ou das minhas pernas. Não que eu não gostasse do café que nós bebíamos no hospital, mas era no mínimo interessante ter uma fonte pra alimentar minha dependência química de cafeína.

Numa manhã quente atípica de abril, concluí meu ritual de parar a moto no estacionamento do campus um pouco mais cedo e caminhar até o Starbucks que ficava há duas quadras dali. Voltei vagarosamente apreciando a bebida e entrei meio desatento, divagando alguma bobagem. Ao ser alvejado pelos olhares de reprovação assim que bati meu cartão, me auto-fuzilei ao me lembrar da festa de despedida que faríamos pela manhã - que aliás, já estava em curso. Hoje era o último dia que Caroline Wazowski estava com a gente, uma das responsáveis pelo setor de pesquisa da minha ala. Não éramos os melhores amigos, mas ela era uma profissional competentíssima da qual nós sentiríamos falta, ela tinha conquistado um subsídio pra liderar uma equipe por alguns meses na Ucrânia, com um Dream Team de cientistas na área de genética, motivo esse pelo qual nos deixaria. Ela era querida por todos ali pela simpatia e a risada gostosa, mas nossa relação se tornara um pouco restrita ao profissional depois que eu acabei sabotando sem querer nosso curto relacionamento. Eu nem chamaria de relacionamento. Os óculos grandes, o cabelo vermelho - sim, ver me lho - o sorriso simpático e seu jeito tradicionalmente atraente eram um cartão de visitas pra qualquer pessoa que se sentisse bem ao lado de alguém que era puro carisma. Nós saímos algumas vezes para beber, pegar um cinema, ela acabou até indo em um show meu no Velvet's. Confesso que ela gostava mais de rock do que eu, talvez por isso eu tenha pedido desculpas tantas vezes por tê-la feito me aguentar cantando e arranhar a guitarra. No final da noite, fiquei bêbado e de certa forma "perdi" meus amigos pra ela. Mea culpa, eu era um pé no saco e ela era bem mais bonita e simpática. Aliás, eu ser um pé no saco foi o que fez com que eu a perdesse. Ora eu era uma compensação absurdamente exagerada de bom humor pra esconder a bagunça na que eu tinha na cabeça; ora eu era só um pé no saco. Ponto.
Caminhei por entre meus colegas, já rindo da minha cara de culpa, e a abracei. Ela tinha um sorriso nada surpreso revelando uma covinha tímida.
"Eu não tinha expectativas em você, pode ficar tranquilo."
Ainda bem que não. E ainda bem que a Srª. Morgan tinha ficado encarregada de trazer as delicatessen, diga-se de passagem. Alguém tinha que ter uma boa memória naquele departamento, e eu liderava o ranking dos piores.
Fiquei no meu canto degustando um bolinho, terminando meu café e observando a sala. As risadas, o bom humor, os jalecos brancos se misturando aos azuis, algo simbólico, metafórico. Todas aquelas pessoas amavam a vida, e amavam mais ainda a vida do próximo, abandonando logo cedo seus lares, certas vezes até tarde da noite, pra mostrar pra essas que elas tinham valor. Me sentia orgulhoso de que a hipocrisia não fizesse parte daquele grupo, esse amor pelas vidas alheias estendia-se aos colegas, não só aos pacientes. Assisti as pessoas abraçando-a, desejando a melhor sorte do mundo, nada que ela não merecesse, achava até que fosse pouco. Eu sentiria falta da risada dela.

Cya.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Traduzir-se.

"Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?" - Ferreira Gullar.

Cya.